José Régio, pseudónimo de José Maria dos Reis Pereira. Nasceu em Vila do Conde a 17 de Setembro de 1901. Licenciado em filologia Românica por Coimbra em 1925, ensinou no Liceu de Portalegre durante mais de trinta anos.
Co-fundador da revista Presença em 1927, nela exerce um magistério crítico que inclui a divulgação e valorização dos autores do primeiro modernismo (nomeadamente, Pessoa, Sá-Carneiro e Almada), a abertura do horizonte de leituras para lá da francofilia tradicional no meio português e a teorização do que seja uma “literatura viva”, por oposição à “literatice”.
Estas preocupações estendem-se às várias facetas da sua obra, que inclui poesia, romance, conto, teatro, ensaio e crítica, constituindo um universo coeso; através da multiplicidade destas formas de expressão, busca José Régio uma voz pessoal e original, não isenta de conflitos: a procura de um equilíbrio entre o humano e o divino, entre o mundo natural e a transcendência, entre o individual e o universal, não exclui o cepticismo nem avanços e recuos nesse caminho de ambiguidades e incertezas.
Talvez por estas preocupações serem, no seu tempo como hoje, polémicas é que a sua obra tem despertado vastas controvérsias por parte da crítica, unânime, no entanto, em o considerar indispensável peça no tabuleiro de um tempo que ajudou, de modo decisivo a definir. Régio foi também um apaixonado admirador e coleccionador de arte popular e reuniu ao longo da sua vida um conjunto de peças de mobiliárioarte sacra, louças, pintura e escultura, que podem ser vistas na casa onde morou em Vila do Conde e que fora pertença de sua tia e madrinha Libânia, onde o escritor veio a morrer em 22 de Dezembro de 1969.
Vila do Conde
A história de Vila do Conde começa propriamente ao longo do séc. VIII a.C., no monte sobranceiro ao rio Ave, com povoamento do castro por uma comunidade celta. Era gente que se dedicava ao pastoreio, à criação de gado e à pescaria.
Depois do século III a. C., é o início da colonização romana. A população desloca-se para as terras baixas à volta do monte. É então que esta área se constitui em vila, ou seja, grande propriedade de um qualquer senhor de Roma aqui residente, ou algum senhor natural, rico e romanizado.
Entre o séc. V e VI da nossa era, chegam os Suevos e cresce a comunidade dos cristãos à volta de uma pequena igreja dedicada a S. João Apóstolo, no alto do Monte. Vêm também os Árabes e a Reconquista Cristã (a partir do século VIII) passa por aqui.
O conde que dá o nome à povoação terá sido Vímara Peres, o senhor de Guimarães e do Porto, cidades com as quais Vila do Conde forma o triângulo estratégico de defesa e consolidação do litoral portucalense. Neste período de inseguranças, a senhora da Vila, de nome Flámula, faz doação da terra ao Mosteiro de Guimarães (século X).
A terra era de camponeses e pescadores do rio e do mar, a viver entre dois pólos: a igreja de S. João no Monte e a ermida de S. Julião, na foz do rio (século XI).Quando chega o século XIII, a Vila era uma terra reguenga, na sua maior parte. O rei D. Sancho faz doação dela à Dona Maria Pais Ribeiro, sua amante. Vila do Conde é, agora, um senhorio feudal com gente serva que pagava tributos em géneros e serviços à senhora Ribeirinha e seus descendentes.
No decurso dos séculos XIII e XIV, Vila do Conde ganha a sua primeira configuração urbana. Vai construir-se o Mosteiro por ordem de D. Afonso Sanches, marido de D. Teresa Martins. Em oposição a este centro de vida feudal, cresce um núcleo urbano de burgueses mercadores que enriquecem no comércio da Flandres, e de entre si sai uma Vereação que, na Praça Velha, assume um governo de autarquia.
Vigora ainda a feudalidade dos tributos de tudo o que se produz ou vende, até da passagem da barca que atravessa o rio. Mas a evolução económica está a determinar progressivamente a mudança.Os séculos XV e XVI são tempos de glória. Vila do Conde ganha uma dimensão nacional pela sua intervenção na gesta dos Descobrimentos oceânicos, com a produção de seus estaleiros (caravelas e naus) e com o saber de seus navegantes. É terra-mãe de marinheiros que acompanham Vasco da Gama à Índia, de Gaspar Manuel, piloto-mor da carreira das Índias, da China e do Japão, de Frei João que foi companheiro e amigo de S. Francisco Xavier no Oriente.
É significativo que D. João II tenha fundado a alfândega e esse facto tenha sido determinante na independência da comunidade burguesa em face do Mosteiro. Vila do Conde torna-se um município, recebe o foral do rei D. Manuel I e, pouco depois, passa a ser um senhorio da Casa de Bragança. Embora tenha uma autonomia controlada, a sua Autarquia exerce doravante uma administração própria. A Igreja Matriz, a Casa da Câmara, o Pelourinho, a Misericórdia, as casas manuelinas e outras obras da constelação urbana que agora se levantam, mostram a cidade a crescer em prosperidade e no sentido do Mar.
No século XVII, a estrutura urbana dilata e, resistindo à crise da época, vai consolidando. O comércio externo faz-se, não só para o Norte da Europa, mas também para o Brasil. É o tempo em que se erguem a Capela do Socorro, o Hospital, o Castelo de S. João Baptista, a igreja do Carmo e outras edificações de vulto.
Mais importante é o século XVIII com as suas casas palacianas, a obra extensa do Aqueduto e a mole gigante do convento de Santa Clara. O alargamento do espaço urbano é o grande acontecimento: Vila do Conde cresce para Norte, com o povoamento de Poça da Barca, Areia, Regufe, Portas Fronhas e Casal do Monte; cresce para Sul, com a construção do cais por enrocamento, fazendo o aterro do Sub-mosteiro, domesticando o rio. É neste tempo que se levanta a ponte de pedra a ligar as duas margens, acabando para sempre com a barca da passagem.
O século XIX é a época da grande revolução. Começa verdadeiramente a história da autarquia contemporânea, com a instituição da liberdade constitucional. Vila do Conde ganha um concelho de múltiplas freguesias, consolidando-se como um grande município, acima e abaixo do Ave.
Ruas e avenidas novas rebentam os limites tradicionais: pelo meio da Vila, passa a Estrada Real, avenida D. Luís I; para Ocidente, abrem-se as ruas de Bento de Freitas e Eduardo Coelho que, ao fundo, recebem transversalmente a avenida Júlio Graça; para Leste, a estação de caminho de ferro e a fábrica da Companhia do Rio Ave; para Norte, começa o povoamento das Caxinas; para Sul, montam-se duas pontes metálicas, rodoviária e ferroviária, de ligação ao Porto.
O século XX continua esta explosão urbana: no desenvolvimento económico, no aperfeiçoamento dos transportes, no aparelho de serviços públicos; no progresso da Cultura e da Educação (o Ensino privado no Grande Colégio de S. José e o Ensino Secundário com a inauguração da Escola Técnica, em 1970), e também no progresso do Desporto (as provas de Ciclismo e a fundação do Rio Ave Futebol Clube, no Campo da Avenida). O que era o movimento urbano de Vila do Conde entre os Anos 30 e os Anos 60, media-se principalmente pelo comércio da Rua das Hortas (Avenida Campos Henriques e, hoje, José Régio), e da Praça da República, com lojas de ferragens, fazendas e louças, cafés, confeitarias, restaurantes, mercearia, relojoarias, ourivesaria, garagens, fotografia, barbearia, pastelaria, consultórios médicos, tudo para o negócio e trabalho, à mistura com repartições públicas.
Vila do Conde era, então, o centro urbano e o seu concelho rural em interacção permanente, visível nas feiras semanais de Sexta-Feira, e, de modo espectacular na festa de S. João e na celebração do Corpo de Deus, com procissão solene e tapetes de flores juncando sumptuosamente ruas e calçadas do velho burgo.Após o 25 de Abril de 1974, Vila do Conde dá um salto qualitativo em frente, fomentando a prosperidade, acelerando o ritmo de progresso em condições de Liberdade que durante o Estado Novo não conhecera, relançando grandes empreendimentos urbanos – da Avenida Marginal ao novo estádio do Rio Ave, da Escola Secundária à Alameda dos Descobrimentos.
Quando em Dezembro de 1987, Vila do Conde é promovida a Cidade, recebe a merecida honra que consagra séculos de sacrifícios e triunfos, uma gesta de grandeza documentada no seu riquíssimo património cultural – monumentos, tradições, artesanato de suas rendas, praias, jardins, casario ribeirinho, estaleiros, museus, teatro, cinema, imprensa, ranchos do Monte e da Praça, instituições de convívio, solidariedade e Cultura em todas as vertentes – tudo quanto é expressão criadora e se envolve na magnífica paisagem urbana de uma terra de eleição que a natureza dotou de beleza incomparável.
Vila do Conde |
Autoria: Dr. Carmo Reis (Professor de História) |
Agradecimentos:
Drª Marta Miranda
Directora da Biblioteca Municipal de Vila do Conde
(Fotografias retiradas do livro “Vila do Conde”)